Admitindo que a notícia do ié verdadeira, eu disponibilizo-me para trocar consigo.
Afinal, a prisão é a vida de sonho que eu tanto queria:
- dormir mais de 7 horas por dia;
- ter tempo para frequentar a biblioteca, ler e ver televisão;
- ir ao ginásio sem pagar;
- não ter de cozinhar todos os dias.
Em compensação, o Sr. fica responsável pela minha família, trabalhar durante o dia e manter um part-time para garantir que os filhos frequentem a Universidade e tenham alguns luxos, como viajar uma vez por ano e alguns dias de férias.
E não se queixe.
Há pessoas com vidas muito piores que a minha.
Mas não se preocupe. Nós iremos assegurar o pagamento da sua diária...
Muitas pessoas ainda hoje me perguntam se não tenho medo de viver num local isolado.
Eu até tenho vizinhos mas estão a umas dezenas de metros de distância. E a casa fica por cima da cidade, com uma vista soberba.
O sol todos os dias se despede de mim. Pena que às vezes o ignoro.
Mas não foi a vista que me levou a viver aqui.
Na verdade, quando decidi construir uma casa, foi a opção mais assertiva. O terreno era herança de família. O que poupei deu para concretizar um outro sonho: dar uma casa condigna aos meus pais.
Coisa que nunca tiveram.
E o privilégio de viver sem incomodar ou ser incomodado pelos outros não tem preço.
Durante anos, o meu filho viveu com uma bola nos pés. Literalmente.
Existia uma bola em cada divisão e ele andava pela casa a pontapeá-las.
De dia e de noite.
Um passo, um chuto.
Tau. Tau. Tau.
Imaginam-se a viver num piso abaixo do meu?
Esta terra foi pisada pelos meus avós e bisavós. Foram eles que plantaram muitas das árvores que aqui existem ou que cuidaram das oliveiras centenárias que me rodeiam. Foi onde o meu pai cresceu e onde eu guardo boas recordações da minha infância.
É um lugar feliz e talvez os meus antepassados ainda por aqui andem a zelar pela família. Porque eu, de facto, sinto-me protegida.
Tranquila.
E a nossa casa é aquele lugar onde o coração encontra a paz!