A moda é um puzzle que não encaixa
PEÇA 1
“Existe uma piada na China, em que dizem que podes descobrir qual a cor tendência de uma estação, apenas observando a cor do rio.”
"A indústria têxtil depende sobretudo de recursos não renováveis – 98 milhões de toneladas, no total, por ano –, incluindo petróleo para produzir fibras sintéticas, fertilizantes para cultivar algodão e químicos para produzir, tingir e finalizar fibras e têxteis. A produção têxtil (incluindo a produção de algodão) também usa cerca de 93 mil milhões de metros cúbicos de água anualmente, contribuindo para problemas em regiões onde a água escasseia.
A utilização de substâncias potencialmente perigosas na produção têxtil tem um impacto sério na saúde dos agricultores e dos trabalhadores das fábricas, assim como no ambiente. É frequente os resíduos industriais e tintas usados pelo sector contaminarem os cursos de água. Estima-se ainda que, durante a lavagem, as nossas roupas libertem meio milhão de toneladas de microfibras de plástico para os oceanos, todos os anos. Estas fibras são ingeridas por peixes e outros animais marinhos e entram na cadeia alimentar, o que significa que podemos acabar por comer as nossas próprias roupas.
A moda, tal como a conhecemos neste momento, é péssima para o planeta. E os impactos negativos que começamos a sentir agora são só a ponta do iceberg: prevê-se que até 2050 continuem a aumentar drasticamente." (transcrição do artigo da Âncora Verde, que aconselho a ler)
PEÇA 2
Quem decide o que está ou não na moda são os criadores e as grandes publicações da especialidade
Vêm-me à cabeça dois exemplos:
- Anna Wintour, a deusa toda poderosa da Moda, dita as tendências universais sobre o que se vai vestir ou retirar do roupeiro.
Ficou mundialmente conhecida por ter inspirado o filme "O Diabo veste Prada". Consta que os entendidos , pela análise da sua expressão facial durante os desfiles, adivinham quais vão ser as próximas tendências da moda.
Estranhamente, sempre a vi com o mesmo corte e cor de cabelo, o mesmo modelo de óculos escuros, o mesmo tipo de saia ou vestido abaixo do joelho, de padrões florais ou cores clássicas.
- Karl Lagersfeld, um dos maiores estilistas de sempre, que tem vestido as mulheres mais inspiradoras do mundo (hoje chamamos-lhe influencers), continua a mostrar a sua criatividade em cada desfile que faz.
Todavia, alguém tem provas de que este senhor veste outras roupas para além das calças e casaco pretos, camisa branca com colarinho alto e laço ou gravata preta?
Como encaixo este puzzle?
Por um lado, vejo uma sociedade fast fashion, ávida por usar as últimas peças da moda, nem que sejam pijamas de luxo, calças rasgadas que só os mendigos usariam, botas esburacadas à frente e atrás, chinelos de verão peludos...
gastam-se recursos finitos do planeta, dinheiro que nos faz falta...
no ano seguinte estão obsoletos (perdão, demodé) e jogamos fora, já que há novas texturas, cores e padrões que precisamos desesperadamente comprar.
As marcas e a publicidade aliciam-nos, os influencers provam-nos que somos extra-terrestres se não usarmos as peças must have da estação...
Por outro lado, observo as mais poderosas figuras da moda a vestir os mesmos padrões, cores e estilos a vida inteira, sempre elegantes e intemporais. E que continuam a ser referências neste estranho mundo.
Isto não bate certo, de facto.
Talvez falte uma peça neste puzzle...
Talvez aquela que consegue encaixar as nossas preferências com a consciência ambiental.
Aquela que permite reduzir o desperdício e aumentar o nosso próprio estilo, com o qual mais nos identificamos e nos favorece.
Depende de nós, de equilibrarmos o prazer da roupa com o respeito pelo mundo em que vivemos.
Está-me a parecer que assim, o puzzle fica completo e saímos todos a ganhar!
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