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A 3ª face

Sex | 20.12.19

Desafio dos Pássaros #15

 

Tema da semana: O Pai Natal decidiu reformar-se e as entrevistas começam esta semana. Descreve uma dessas entrevistas na perspectiva do recrutador de recursos humanos: A Rena Rudolfo.

 

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Continuo a achar que uma ala psiquiátrica é como uma loja: há de tudo!

Sinto-me bem melhor e como ando calma e estável, as enfermeiras deixa-me andar por aqui, a interagir e a apoiar outros doentes.

Há de tudo!

A D. Alda tem uma grave depressão pós-parto e não há meio de melhorar.

A Zéfinha, como quer ser chamada, foi encontrada a 15 km de casa, depois de buscas durante dois dias: estava a seguir a luz do marido, diz. Apesar deste ter morrido há quase 20 anos.

O Diogo, um jovem de 19 anos, teve mais uma crise psicótica depois de misturar metadona e heroína e continua amarrado à cama.

 

E hoje, conheci um novo doente: o Sr. Nicolau.

Chegou ontem à noite, agarrado por dois enfermeiros e dois seguranças, a gritar que não está maluco.

Espreitei pela fresta da porta. Viu-me e fez um sorriso nervoso mas apelativo, entre as  barbas brancas. Pareceu-me que suplicava por conversa.

E tinha razão.

Falou-me sobre a sua vida.

Muito coerente. Muito gentil e educado.

 

- Porque está aqui, Sr. Nicolau?

Ignorou e continuou a falar do neto.

Insisti, num tom mais alto.

-Porque está aqui, Sr. Nicolau?

- Eu não estou maluco, acreditas em mim? Eu conto-te a verdade.

Fui a uma entrevista de emprego, numa empresa de trabalho temporário porque vi um anúncio a pedir um Pai Natal. Aquilo estava cheio, toda a gente a querer um part-time nesta altura.

A entrevista parecia estar a correr bem.

Quando entrei, o entrevistador apresentou-se.

Boa tarde. Sou Rena Rudolfo. Vem para substituir o sr. que se vai reformar?

-Prazer. Sou Nicolau, o Pai Natal.

- Nome muito a propósito!

- Então que competências acha que tem para a função?

- Todas, senhor Rena. Tenho um trenó feito por mim e conto consigo para o puxar. Depois de localizar as casas, entro pela chaminé e trato do assunto num instante.

Mas antes, ando por aí com o saco a chamar as criancinhas.  Acho que vamos fazer uma boa equipa, rena Rudolfo. Ho Ho Ho.

 

Agradeceu e mandou-me esperar na sala.

Minutos depois, apareceu a PSP e a ambulância e para aqui me trouxeram.

 

Foi um mal entendido.

O meu amigo Zé, que tinha ido comigo, telefonou-me agora.

Explicou-me que me enganei no gabinete. Entrei para a entrevista de porteiro de um infantário. O entrevistador chama-se Renato Rudolfo.

Eu não estou maluco…apenas um pouco surdo, mas  tento que ninguém perceba.

 

 

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