Desafio dos pássaros #2.5
Tema da semana: Acordas e tudo o que mais desejavas realizou-se: conta-nos o teu dia
Dizer que acordei não me parece bem.
Tenho a sensação de que não embalei no sono durante a noite inteira. A excitação e a antevisão do dia não deixaram Morfeu entrar no quarto.
Levanto-me, tomo banho, emborco meio frasco de perfume pelo tronco e começo a vestir-me. Os sapatos bicudos apertam. E a camisa branca, cheia de goma, revela-se áspera no pescoço.
Mas vai valer a pena. É o sonho da minha vida prestes a realizar-se!
Tento ajeitar o plastron dentro do colarinho mas é tarefa complicada.
Vou ao quarto da minha mãe e, para grande surpresa, também já está vestida.
A minha mãe é linda mas depois de penteada e maquilhada por uma profissional, parece uma bonequinha de porcelana.
Ajeita-me e aproveita para me colocar o raminho na lapela, a fazer pandant com o bouquet da noiva.
E para disfarçar o nervosismo e a responsabilidade, trauteio a canção que não me saiu da cabeça durante a noite inteira: ´Cause I’m happy…
Estamos prontos.
Entramos no carro e só paramos à porta da Igreja, onde os convidados nos aguardam.
A minha mãe vai serena, a passo lento, cumprimentando toda a gente, qual rainha com a tiara na cabeça.
E eu, Pontes Manuel, enlaço-lhe o braço enquanto tremo como uma taça de Jelly Já!
Curioso! Nunca percebi o quão comprido é o corredor da igreja!
Chegados ao altar, ela beija-me, desenlaça-me e junta-se ao meu pai.
“O meu sonho realizou-se ”penso, enquanto ocupo o lugar.
O meu lugar de padrinho…
Os meus pais casaram à pressa, pelo civil, quando eu já vinha a caminho.
Quando tinha 10 anos e depois da minha mãe descobrir a causa de tanta avaria no carro da vizinha, que o meu pai se disponibilizava para arranjar, separaram-se.
Foi o meu maior desgosto e durante mais de um ano tive acompanhamento psicológico.
Pior ficou o meu pai, que se arrependeu no dia seguinte.
Depois de 4 anos a implorar perdão, a minha mãe achou que já era altura de lhe levantar o castigo e “se o pobre homem tinha aguentado 4 anos a tentar reatar o casamento, agora era para o resto da vida”.
Quis o casamento que nunca tivera.
E eu fui o padrinho.
Nunca pedi brinquedos no Natal. Pedia que os meus pais se reconciliassem.
Talvez o Pai Natal só agora tivesse arranjado tempo para ler as minhas cartas.
Não é Dezembro mas, neste momento, estou a contemplar o meu presente…