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A 3ª face

Sex | 04.10.19

Desafio dos Pássaros #4

 

 A Beatriz disse que não. E agora?

 

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Às vezes fico deitada, de olhos muito cerrados.

Inerte.

Como a minha vida.

E aí pergunto-me:

- Como será o amor de mãe? Qual a sensação de sentir o amor e protecção incondicional de quem é capaz de ler no nosso silêncio tudo aquilo que sentimos?

 

Relembro-me sempre da Beatriz, a minha melhor amiga de infância.

A sua mãe era muito jovem e quem não as conhecia jurava que eram irmãs.

A relação era tão forte e próxima que não tinham segredos.

A Beatriz contava tudo à mãe: as intriguinhas da escola e os namoricos. E a mãe desabafava com ela os desgostos de amor dos sucessivos namorados e os segredos do mundo dos adultos.

Foi aí que descobri que os problemas das pessoas crescidas e das crianças não diferem assim tanto: queixam-se do que não conseguem comprar, do comportamento dos maridos ou mulheres, das discussões com colegas e do excesso de trabalho.

 

Um dia confidenciei-lhe a minha paixão secreta pelo Tomás e ela, em três dias, conseguiu aproximar-nos.

A minha primeira grande amiga e o meu primeiro grande amor!

 

Cerca de um mês depois, ao abrir a mochila, reparei num bilhete estranho.

Abri.

“O Tomás anda a trair-te com a Beatriz, ó parola!  

 

 Que disparate!  Agora inventavam coisas para que perdesse o namorado e a melhor amiga.

 

Mas depois, lembrei-me que, ultimamente, a Beatriz não saía da escola comigo...

E ainda sinto o soco no estômago quando, no dia seguinte, os descobri atrás da cantina, de mão dada.

 

Antes do jantar, decidi ir à casa dela.

Toquei à campainha e a mãe apareceu entre portas.

- Posso falar coma Beatriz?

- A Beatriz agora não pode. Falam amanhã na escola – pelo modo, percebi que a mãe estava a par de tudo e não queria que eu entrasse.

- Mas eu preciso falar com ela! – insisti.

- Mas ela não quer. A Beatriz disse que não. E agora? Queres ficar aqui à porta até amanhã de manhã? Gira, desaparece!

 

Eu não voltei a falar com a Beatriz e nunca mais me cruzei com a sua mãe.

Sobre esta mãe tão cúmplice, só alguns anos mais tarde ouvi falar, quando a minha avó me coscuvilhou que a Beatriz tinha apanhado o noivo na cama com a própria mãe, num dia que chegara mais cedo da faculdade.   

 E que por isso, agora estava a viver com a avó.

Ironias…

 

(continua...)

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