Dezasseis...
Nem todos os nascimentos têm tempo para grandes emoções.
Alguns poderiam ser argumentos de um filme cómico sobre maternidade.
E o teu foi mais ou menos assim.
Pedi que não nascesses no Natal nem no Ano Novo.
Imagino que deve ser triste para uma criança não ser o rei da sua festa. E ter de dividi-la com o Menino Jesus ou com um ano novo qualquer, que ainda por cima nunca é o mesmo.
Há 16 anos, a passagem de ano foi na nossa casa.
Fartámo-nos de trabalhar.
Preparar o jantar, a ceia, a festa, que durou dois dias.
No dia 2 limpámos e arrumámos a casa.
Encostei a esfregona à porta do quarto às 2 da manhã.
Deitámo-nos.
Mas às 4, mostraste a tua revolta. Se era para trabalhar assim, mais valia sair.
Estava na hora.
Levantei-me e, calmamente, fui arrumando o que já estava arrumado: o saco da maternidade e o ovinho.
Deixei a roupa preparada para a mana vestir de manhã.
E às 7 horas, telefonei ao pai, que estava a trabalhar a 70 km de distância:
- Acho que está na hora de irmos para a maternidade.
- Agora? Agora não posso que às 8 tenho um compromisso. Podes esperar?
???
- Ah, tá bem, eu espero.
Não espero. As contracções tornaram-se menos espaçadas e meia hora depois voltei a telefonar.
- Tens de vir já. Ou vou para o hospital.
Quando chegou, eu estava pronta.
Mas ele trazia o carro carregado de dossiers, computador (torre, monitor, impressora) e teve de o descarregar primeiro (imagina um filme acelerado e vês o teu pai a correr entre a casa e o carro, p’raí umas 5 vezes).
Até à maternidade tínhamos quase uma centena de quilómetros pela frente.
A caminho de Almada.
À hora de ponta…
- E se eu me engano na saída e vamos directos para Lisboa???
O teu pai, às vezes, tem os comentários mais inapropriados, na hora errada, não é?
Conseguimos chegar.
O carro ficou à porta da urgência, mal estacionado.
O pai ficou com o meu processo a fazer a ficha de entrada e eu fui ser observada.
A enfermeira colocou-me numa cadeira de rodas e foi gritando para não fazer força, enquanto me conduzia em alta velocidade até ao bloco de partos.
O pai chegou a tempo de te ver nascer, depois de ter derrubado um sinal de trânsito e de ter amassado a parte de trás do carro, a estacionar!
Mas estava lá quando nasceste. Com duas orelhas e cinco dedos em cada mão e em cada pé, que eu fiz questão de contar…
e foi ele que te cortou o cordão umbilical.
Foste um bebé tranquilo e bem disposto.
Durante vários anos, tive medo.
Tive muito medo.
A tua maturidade emocional e o “bom coração” levavam-se a suspeitar que estavas aqui por engano.
Que eras um anjo que, por acidente, me tivesse caído no colo.
E que, a qualquer momento, Deus se ia aperceber que não estavas no céu e te vinha buscar.
A adolescência dissipou-me o receio.
Às vezes, consegues-me tirar do sério.
Mas mesmo aí, continuo a admirar a tua inteligência e a rapidez de raciocínio.
A tua cultura geral.
Por isso às vezes te provoco. Só para te testar…
Dezasseis.
Dezasseis anos que passaram num ápice.
É a fase de andares à nora, sem perceber o que vai ser o futuro.
Aliás, nem sabes muito bem o que é o presente, pois não?
Ainda não compreendes mas um dia vais ler isto e perceber que as mães têm de ser chatas.
Que têm de repetir muitas vezes os mesmos sermões para soprarem do coração o medo de vos ver sofrer.
A vida vai ensinar-te isto. A seu tempo.
Por ora, só queria que percebesses isto:
Que tens capacidade para seres o que desejares. E que conseguirás mudar o mundo, se assim quiseres.
Só tens de te empenhar.
Muitos parabéns, meu príncipe!